Finlândia: A tragédia e o controle de armas

A Finlândia sucumbe à solução fácil para as causas da tragédia da escola: controlar a venda de armas de fogo. Como se isso resolvesse o problema.

Vemos pela matéria abaixo, da Folha de hoje (10/11/2007), que a venda de armas era liberada para maiores de 15 anos na Finlândia. A moral a se tirar dessa história é esta: durante toda a sua história livre, jovens finlandeses de 15 anos podiam legalmente comprar armas de fogo, fato que fez da Finlândia o terceiro país do mundo em número de armas de fogo por habitante (atrás dos Estados Unidos e do Iêmen), e, no entanto, NUNCA ANTES NAQUELE PAÍS ocorreu uma tragédia como a que acontece agora. Ou seja, o fato de a venda de armas de fogo ser livre para maiores de 15 anos não aumentou os assassinatos nas escolas da Finlândia nem um ponto percentual, porque nunca havia acontecido um antes.

Propõe-se agora que 18 anos seja a idade mínima para a compra de armas de fogo. Mas o rapaz que assassinou seus colegas e a diretora da escola tinha mais de 18 anos!

Até que ponto vai a insensatez dos políticos? Procuram a chave debaixo do poste, não porque a tenham perdido ali, mas porque ali há mais luz…

Em Salto, 10 de Novembro de 2007

Folha de S. Paulo
10 de Novembro de 2007

TRAGÉDIA
Finlândia veta a venda de armas para menores

DA REDAÇÃO

A Finlândia anunciou ontem que aumentará de 15 para 18 anos a idade mínima para que alguém possa comprar arma de fogo. A decisão foi provocada pela tragédia da última quarta-feira, quando Pekka-Eric Auvinen matou seis colegas e dois funcionários de sua escola, antes de se suicidar.

Embora ele já estivesse com 18 anos, o episódio gerou uma discussão sobre limitações. Segundo entidade suíça, só os Estados Unidos e o Iêmen têm mais armas por habitante que os finlandeses.

Em Kirkkonummi, sul do país, uma escola entrou em pânico depois de ameaças por e-mail de que nova matança de estudantes estava para ocorrer.


Com agências internacionais

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Finlândia: a tragédia na escola

Eu havia dado por encerrado este space sobre a minha viagem à Finlândia. Mas a tragédia na escola de Jokela (em Tuusula, no sul da Finlândia) em que um jovem de 18 anos matou sete colegas, a diretora da escola, e, depois, a si próprio, tudo isso no dia seguinte ao do meu retorno da Finlândia, me fez decidir acrescentar mais um triste capítulo a este blog.

Transcrevo abaixo a notícia dada pela Folha de S. Paulo de hoje. Parece, de início, inexplicável — embora, como em casos semelhantes, especialmente nos Estados Unidos, os detalhes que inevitavelmente irão aos poucos surgindo nos próximos dias certamente removerão, em parte, a inexplicabilidade do caso. Em parte, digo eu, porque dificilmente conseguiremos considerar plenamente explicado um acontecimento como este em que fica evidente que a vida de uma pessoa jovem, num país rico, cuja educação é considerada a melhor do mundo, pode, ainda assim, dar terrível e tragicamente mente errado.

Não tenho dificuldade em entender o fato de que alguém queira colocar fim à própria vida. Ainda que como exercício acadêmico, já refleti, várias vezes, sobre que acontecimentos e condições poderiam me levar, um dia, a tomar uma decisão dessas. Não sei se, se concluir um dia que o contexto justifica uma decisão desse tipo, terei coragem de implementá-la. Mas consigo entender, in abstracto, que alguém possa decidir matar-se e implementar essa decisão.

A escolha da forma que o suicídio vai tomar revela um pouco da mente do suicida.

Há gente que se mata quietinho, tomando uma dose excessiva de remédios, ou ingerindo veneno. Quem os descobre mortos certamente deve levar um choque, mas, de início, o choque não será diferente do que se tem ao se descobrir morta uma pessoa que foi dormir bem — e que morreu de causas naturais durante o sono.

Há gente que escolhe uma forma de suicídio mais teatral. Afogar-se num rio ou no mar andando para dentro da água. Ou jogar-se de uma ponte — a Golden Gate Bridge de San Francisco parece ser quase irresistível para suicidas assim mais teátricos, a ponto de terem colocado grades na beirada da ponte para impedir que as pessoas saltem para a morte.

Há ainda gente que dá tiro na cabeça, salta de prédios, etc., deixando à vista dos infelizes que acorrem ao local primeiro um cenário deprimente, com sangue por todo lugar — e, por vezes, mais que isso.

Há gente que se suicida em público, procurando levar consigo o máximo de pessoas, como os homens/mulheres-bomba, mas que fazem isso por uma causa política. A publicidade e a teatralidade do ato é, neste caso, parte da motivação. Na verdade, a pessoa, na realidade, nem quer se matar por algum problema pessoal que esteja enfrentando: quer causar impacto, quer fazer uma declaração política — matar os outros e a si próprio no processo é parte dessa declaração política,

O que acho difícil de entender são os que, como o rapaz desta história, resolvem se matar em meio a uma grande matança de gente que, aparentemente, nada tem que ver com os suicidas, mas que, a primeira vista, não estão fazendo uma declaração política, ou, se o estão, essa declaração é tão sussurada que poucos conseguem entendê-la.

Por que esse gesto de morrer matando, por que não morrer quieto e sozinho num canto, por que morrer fazendo um espalhafato e esparramando sangue?

Parece que há, no caso, uma tentativa de fazer algum tipo de declaração. Como no caso recente nos Estados Unidos, que acaba de completar um ano, há vídeos no YouTube, há mensagens na Internet. Mas os vídeos parecem ser meio crípticos. O fundo musical já foi usado em outra tragédia semelhante, em Columbine… Será que os eventos ocorridos em escolas americanas inspiraram — se é que esse termo é apropriado — o suicida?

O suposto autor dos vídeos declara: "Estou preparado para lutar e morrer por minha causa". OK. Há muita gente disposta a fazer isso. Mas qual é a causa??? "Como um selecionador natural, eliminarei todos aqueles que vejo como desgraças inaptas para a raça humana e como falhas da seleção natural", segue o texto (segundo a versão da Folha). Mas será que a melhor forma de eliminar "desgraças inaptas" que surgiram como "falhas da seleção natural" é matando gente aleatoriamente, sem vê-las, por detrás de portas fechadas? 

Morrer fazendo uma declaração e levando outros consigos é até inteligível — desde que a linguagem da declaração seja inteligível. O árabe que se explode em um shopping center israelense, ou o muçulmano que explode o avião em que se encontra nas Torres Gêmeas fazem declarações políticas que é possível entender, mesmo que seu objeto seja indefensável moral e politicamente.

Mas morrer fazendo uma declaração ininteligível é algo difícil de entender. Especialmente quando se trata de uma pessoa jovem que, por mais errado que tenha saído sua vida até aqui, tem, na realidade, pelo menos mais quatro ou cinco dessas vidas pela frente para acertar o que está errado — até porque vive num país rico economicamente e culturalmente, freqüenta uma escola que é tida entre as melhores do mundo, e tem à sua disposição, na escola, um sistema elaborado de "student welfare" que poucos países possuem — eu nunca havia ouvido falar de uma instituição desse tipo dentro do sistema escolar: um setor do Ministério da Educação preocupado exclusivamente com o bem-estar do estudante.

Vamos ver se, nos dias que seguem, as investigações descobrem evidências que ajudem dar alguma aparência de sentido ao que, no fundo, ficará para sempre sem sentido.

Eu, por meu lado, fico com uma pulguinha atrás da orelha. Nos últimos três dias a única música que tenho ouvido é de Jean Sibelius, o maior compositor finlandês da história. As músicas são maravilhosas: as sinfonias, os concertos para violino… Lindas, lindas, lindas — quase digo "lindas de morrer"… E tristes, tristes, tristes. Até a valsa mais famosa — e mais linda — que ele compôs é chamada de Valsa Triste: tristemente linda. Até eu, em regra alegre, fico triste e macambúzio ao ouvi-la. Talvez ficasse até deprimido, se não pudesse olhar para fora e ver o sol brilhando, o céu azul, os flamboyants em flor, os pássaros cantando… — e se não pudesse, de vez em quando, ouvir um sambinha alegre e malandro.

Por fim… fico imaginando se as manifestações das autoridades educacionais finlandesas nos eventos de que participei nos últimos quinze dias seriam, à vista da tragédia, mais reflexivas e menos auto-louvativas do que foram. Ou se elas iriam se auto-elogiar por terem tratado rápida e eficientemente o problema…

Em Salto, 8 de Novembro de 2007


Folha de S. Paulo
8 de novembro de 2007

Estudante na Finlândia mata sete colegas e diretora

Agressor se suicida; vídeo no YouTube prenunciou massacre na escola Jokela

Pistola foi registrada pelo adolescente de 18 anos; 3º país em porte de armas per capita, Finlândia nunca tivera incidentes do tipo

DA REDAÇÃO

Um adolescente armado que aparentemente postou clipes com ameaças no site YouTube matou ontem sete colegas e a diretora de sua escola em Tuusula, no sul da Finlândia. Dez outras pessoas foram feridas ao tentarem fugir do local.

Portando uma pistola .22, o rapaz de 18 anos cuja identidade não foi revelada entrou na Escola Jokela, pouco antes do meio-dia (8h em Brasília), e percorreu classe por classe, atirando, antes de se matar. Com uma bala na cabeça, chegou a ser internado em um hospital local, mas não resistiu.

"Ele avançou sistematicamente pelos corredores da escola, batendo nas portas e atirando através delas", disse a professora Kim Kiuru. "Meus alunos gritavam, perguntando o que fazer, e eu lhes disse que saltassem pela janela. Todos se salvaram", contou.
Tuomas Hulkkonen, um aluno que disse conhecer o agressor, afirmou a uma rede de TV que o rapaz vinha agindo "de modo estranho" ultimamente. "Ele se recolheu em sua concha. Só notei essa mudança recentemente e achei que ele talvez estivesse meio deprimido. Mas nunca achei que ia acabar assim", disse o rapaz à MTV3.

Cinco garotos, duas meninas e uma mulher foram mortos, informou Matti Tohkanen, chefe de polícia de Tuusula, cidade de 35 mil habitantes a cerca de 50 km de Helsinque. O agressor, disse, vinha de "uma família comum" e não tinha antecedentes criminais. A arma usada no ataque era legal e fora registrada pelo próprio adolescente no último dia 19.

"Quando a polícia chegou, era o caos completo, havia alunos pulando das janelas", disse o inspetor Timo Leppala. A Jokela tem cerca de 500 alunos do ensino médio e fundamental, com idades de 12 a 18 anos.

O premiê Matti Vanhanen disse que se trata de "um evento extremamente triste".

Vídeo

O vídeo no YouTube – tirado do ar – mostrava a foto de um prédio que parecia a Jokela com o rock "Stray Bullet" (Bala Perdida) ao fundo. Em um recurso de edição, a foto se partia e dava lugar à imagem, em vermelho, de um homem apontando uma arma para a câmera.

O clipe, intitulado "Jokela High School Massacre – 7/11/ 2007", foi postado por Sturmgeist89. Mensagem do mesmo autor diz: "Estou preparado para lutar e morrer por minha causa". "Como um selecionador natural, eliminarei todos aqueles que vejo como desgraças inaptas para a raça humana e como falhas da seleção natural", segue o texto.

A letra de "Stray Bullet", do KMFDM, já figurou em um site mantido por Eric Harris, co-autor do massacre da escola Columbine, nos EUA, em 1999.

Outro clipe postado pelo mesmo Sturmgeist89 mostra um rapaz de jaqueta escura carregando uma pistola e disparando em um bosque. No fim, ele sorri e acena para a câmera. Num terceiro vídeo, há fotos do mesmo garoto com uma pistola e uma camiseta na qual se lê: "A humanidade é superestimada".

Até o fechamento desta edição não se sabia, no entanto, se o menino nos vídeos era o mesmo que executou o ataque.
Apesar de ter o terceiro índice mundial per capita de porte de armas – 56 para cada cem pessoas, atrás de EUA e Iêmen -, incidentes como o de ontem são raros na Finlândia.

Segundo a mídia local, houve quatro esfaqueamentos em escolas do país desde 1999, nenhum deles fatal. Este é o primeiro caso de tiroteio.

[Com agências internacionais]

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O décimo sexto dia da viagem: 6 de Novembro

Finalmente, estou em casa. O vôo ontem à noite atrasou para sair de Washington: em vez de sair às 21h45, saiu às 22h45 — com uma hora de atraso. Mas chegou aqui com apenas 45 minutos de atraso. Tivemos mais sorte do que os que iriam viajar no outro vôo da United, que sai de Washington quase na mesma hora, mas vai para o Rio de Janeiro. O vôo foi adiado por 12 horas. Se já saiu de lá, deve ter saído por volta das 10 da manhã de hoje.

Quando estava chegando a São Paulo, o avião finalmente desceu abaixo das espessas nuvens e eu olhei a paisagem e eis que estava passando por cima de Campinas. Vi que era uma cidade grande, mas o que me permitiu identificar imediatamente foram dois grandes campos de futebol, próximos um do outro: o Moysés Lucarelli, da Ponte Preta, e o Brinco de Ouro da Princesa, do Guarani. A partir dos estádios reconheci o Viaduto Laurão, vi o meu bairro, vi o Shopping Iguatemi, o Carrefour, o trevo de Souzas… Depois fui acompanhando a Anhangüera e, quando as duas se cruzam, a Bandeirantes, até a Marginal do Tietê, momento em que o avião fez uma curva de 90 graus e se dirigiu para Cumbica. Foi muito gostoso ver Campinas lá de cima.

Cheando em casa, achei tudo em ordem, tomei banho, almocei, desfiz a mala — e vim ver meus e-mails.

Viagem finda, portanto, e, com ela, este blog.

Obrigado aos que me acompanharam.

Em Campinas, 6 de Novembro de 2007.

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O décimo quinto dia da viagem: 5 de Novembro

Escrevo, no momento, aqui do Dulles Airport, em Washington, DC. Não consegui dormir direito a noite passada. Fui dormir por volta das 20h, porque teria de me levantar por volta das 4h da manhã. Mas daí fiquei pensando no que escrever sobre a educação na Finlândia e me levantei, tomei uma cerveja e fiquei escrevendo até concluir e publicar aqui no Space. Depois vi um pouco de TV e acabei cochilando só por volta da 1h da manhã, já hoje. Todos esses horários são de Helsinki (GMT +2). Por volta das 3h acordei e resolvi tomar banho, fazer a barba, e me arrumar. Por volta das 4h30 desci, paguei a conta, e peguei o ônibus das 4h40 para o aeroporto. Lá peguei a mala que havia deixado no guarda-volumes e fui fazer check-in na Lufthansa. Felizmente a loirinha não se invocou com o peso de minha mala, que estava em 36 kg (32 é o limite). Do check-in fui para a lounge da SAS, tomei um café bom com um pão delicioso e umas fatias de queijo e salame. Por volta de 6h30 fui para o portão de embarque e o vôo saiu no horário, às 7h10, lotado. Chegou às 9h30 em Frankfurt, horário local (GMT +1). Aeroporto bagunçado, em reforma, cheguei num terminal e tive de ir embarcar no outro. Achei a lounge da United, fiquei lá um pouco, mas logo chegou a hora de embarcar (11h, local — 5h, horário de Washington, que era o destino do vôo, que fica GMT -5). O vôo foi tranqüilo, a comida e a bebida no padrão de sempre. Sentei-me ao lado de um funcionário aposentado do Departamento de Estado, que estava voltando de uma missão especial de dois meses, como autônomo, na Jordânia. Conversamos bastante, conversa boa. Cheguei aqui a Washington às 2h, hora local, quase nove horas depois. O vôo demorou mais, por causa do mau tempo e ventos contrários. Estou aqui desde então (depois de passar Imigração e a Alfândega, naturalmente), na lounge da United. Já conversei com a família e com alguns amigos de Redmond e de Salto.. Mue vôo para o Brasil só sai às 21h30 (são 18h). Ainda vou dar uma voltinha na boa livraria que tem aqui.

Gastei meu tempo aqui na lounge convertendo para mp3 os oito CDs de Jean Sibelius que comprei em Helsinki, na Duty Free. Lindos, lindos. Tenho todas as sinfonias que ele fez, mas não me canso de ouvir Finlandia e Valsa Triste — ambas tristes, mas que causam deleite à alma. Um dos CDs tinha Finladia só orquestrada, o outro com a participação de um coral. Fiquei com os olhos cheios de lágrimas me lembrando de quando cantava esse trecho coral no orfeão do Instituto José Manuel da Conceição, em Jandira, SP, sob a regência do Maestro João Wilson Faustini, então meu professor, hoje meu dileto amigo. Estava conversando com o irmão dele, Marcos Cláudio, via Instant Messaging. O Marcos Cláudio era irmão mais novo e estudava também no JMC (ele fazia o Ginásio, eu o Clássico). Não éramos muito amigos na época, mas ficamos depois. Gente muito fina. Estávamos conversando exatamente sobre a Finlandia do Sibelius. Na versão traduzida para o Português que cantávamos o trecho mais bonito dizia: "Descansa oh alma, eis o Senhor ao lado!".

Para uma biografia de Sibelius vide a WikiPedia:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Jean_Sibelius 

Bom… o dia vai chegando ao fim, e a viagem também. Chego amanhã em São Paulo por volta das 10h20 da manhã. Amanhã ainda escrevo um pouquinho para dar um arremate a este Space de viagem.

Em Washington, 5 de Novembro de 2007

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A Finlândia e a educação

Termino hoje uma estada de basicamente dez dias na Finlândia. Saí do Brasil no dia 22/10, à noite, num itinerário que me levou para os Estados Unidos primeiro e, em seguida, para cá. Cheguei aqui dia 24/10, à noite. Estarei saindo amanhã cedo, devendo chegar no Brasil no dia seguinte, dia 6/11. Vim a serviço da Microsoft. Participei (como já disse neste blog) de quatro eventos:

* "Third ‘Innovative Teachers Forum’"

* "Third ‘School of the Future’ Summit"

* "Second In-Person Meeting of the Schools of the ‘Innovative Schools Program’"’

* "Meeting of the International Advisory Board of the ‘Partners in Learning’ Program".

Todas as expressões colocadas entre aspas simples são programas educacionais da Microsoft. Em reconhecimento pelo destaque que a Finlândia tem alcançado na área da educação, a Microsoft resolveu concentrar num mesmo período as reuniões anuais de seus principais programas voltados para Educação Básica (K-12). Tenho sido privilegiado de acompanhá-los todos desde o início, em 2003, quatro anos atrás. Is três primeiros programas fazem parte da iniciativa "guarda-chuva" "Partners in Learning" ("Parceiros na Aprendizagem", no Brasil, "Alianza por la Educación" no restante da América Latina).

A propósito, está disponível no site da Microsoft Education um relatório em PDF dos primeiros quatro anos e meio de "Partners in Learning". Os interessados podem baixá-lo no seguinte endereço:

http://www.microsoft.com/education/PartnersinLearning/2007ProgressReport.mspx 

As reuniões aqui foram entremeadas de visitas a escolas e de palestras por autoridades educacionais finlandeses. Eu dei um dos keynote speeches no segundo evento ("Third ‘School of the Future’ Summit"), no dia 30. Comecei minha fala, que teve como título "Change, Innovation and Accountability", destacando os contrastes do desempenho dos alunos de 15 alunos finlandeses e brasileiros no PISA ("Programme for International Student Assessment") da OECD ("Organisation for Economic Cooperation and Development"). Os sites respectivos são os seguintes:

http://www.pisa.oecd.org/

http://www.oecd.org/

Minha palestra foi muito parecida com uma palestra que venho dando há alguns anos em Hong Kong, Coréia do Sul, Cingapura e Taiwan — países (Hong Kong na verdade é uma região, mas considero como uma país, dadas suas diferenças do restante da China) que também têm obtido grande visibilidade na área da educação — Hong Kong e Coréia do Sul disputando com a Finlândia os primeiros lugares. É interessante registrar que Macau — que também é região especial da China hoje, foi colonizada durante vários séculos pelos mesmos portugueses que nos colonizaram e só foi devolvida à China em 1996 — também obteve resultados bastante significativos no PISA de 2003.

Tenho conversado bastante, nos últimos anos, com educadores finlandeses e desses quatro países asiáticos (já estive em Macau, mas só para conhecer: não conversei com nenhum educador de lá). Comecei minha palestra em Helsinki, realizada na abertura de um evento sobre "A Escola do Futuro", perguntando se nós, que não éramos desses países, imaginávamos que esses países já teriam alcançado "A Escola do Futuro". E relatei que — diferentemente das autoridades dos Ministérios da Educação desses países (e, aqui entre nós, do que a mídia parece pensar) — muitos educadores desses países, longe de ficarem satisfeitos com os resultados alcançados, estão preocupados, pois estão convencidos de que as escolas de seus países estão longe de ser qualquer coisa que possa ser descrita como "Escola do Futuro" e receiam que toda esse publicidade dada à suas escolas vá tornar cada vez mais difícil transformá-las significativamente, como eles acham que deve acontecer. Muitos têm receio de dizer isso em voz alta, porque vão parecer traidores da pátria, exatamente em seu momento de maior brilho — mas é isso que pensam quando se permitem discutir os problemas em ambientes sem visibilidade mediática (como, por exemplo, no caso dos finlandeses, tomando a deliciosa vodka "Finlandia" bem gelada, beliscando canapés de salmão defumado ou de ostras fritas no alho, em preparação para um jantar de filé de rena e lingüiça de alce). (E tem gente, como Jacques Chirac e Silvio Berlusconi que dizem que a Finlândia tem a pior comida da Europa. Só um francês e um italiano esnobes, que acreditam que só a França e a Itália fazem comida decente, poderiam dizer uma besteira dessas.)

Mas voltemos ao que interessa. Dado o contexto que acabei de descrever, e que descrevi também na minha palestra, propus-me discutir no restante da palestra o que, a meu ver, está acontecendo que pode explicar esse quase paradoxo: o mundo inteiro querendo saber o que a Finlândia e a Coréia do Sul estão fazendo na área da educação, para poder imitá-las, e educadores desses países receosos de que toda essa visibilidade possa dificultar o aparecimento de um processo de real transformação de suas escolas que eles consideram indispensáveis.

Vou resumir aqui o que penso, enunciando, de forma condensada, várias teses. Não vou defendê-las extensamente aqui (em alguns casos, não vou nem sequer tentar defendê-las). Mas considero todas elas muito defensáveis.

1) Nossa época, descrita como Sociedade da Informação ou Era do Conhecimento, é mais aptamente descrita como Era de Mudanças e Inovação.

2) Mudanças podem ser classificadas de várias maneiras, mas a mais interessante categorização, no contexto, é a que coloca:

a) de um lado, mudanças parciais, graduais, incrementais, que não se distanciam significamente de práticas presentes, e, portanto, levam a reformas; e

b) de outro lado, mudanças sistêmicas, rápidas, inclusivas, que se distanciam radicalmente de práticas presentes, e, portanto, levam a transformações (ou, se preferem, revoluções).

3) Tem-se mostrado de forma convincente que o principal critério que nos permite colocar mudanças numa ou noutra dessas duas categorias é o grau de inovação que a mudança implica.

4) As mudanças que caracterizam nossa época (exceção feita à escola) são do segundo tipo e esse fato tem provocado uma verdadeira revolução na economia, nas empresas, nas instituições em geral, até mesmo nos governos (sempre excetuada a escola).

5) Focando agora a escola, pequenas mudanças parciais, segmentadas, graduais, incrementais, DENTRO da escola atual (no currículo, na metodologia, na forma de preparação do professor, na introdução de tecnologia, etc.), ainda que, isoladamente inovadoras, não serão suficientes para INOVAR A ESCOLA em si, na forma radical em que essa inovação se torna, hoje, necessária.

6) O que é preciso, hoje, se a escola vai continuar a ser pedagogicamente relevante nos processos de aprendizagem das pessoas, em especial das crianças da chamada "geração digital", é reinventar a escola de forma sistêmica, repensando-a de forma global, sem compromissos com as suas práticas atuais.

Esse é o contexto teórico em que me proponho discutir a questão das escolas finlandesas e das escolas dos países asiáticos que mencionei.

Minha experiência de várias visitas aos países asiáticos nomeados nos últimos quatro anos, e em grande medida confirmada pela minha visita à Finlândia agora, é que a escola desses países alcançou um nível excepcional de qualidade DENTRO DO CONTEXTO DA ESCOLA TRADICIONAL.

Cansei de ver escolas nos países asiáticos com mais de 40 alunos na classe, todos eles sentados em fila, segundo o número de matrícula, uniformizados e com o número de matrícula gravado na camisa, quietinhos e disciplinados (chegaria a dizer amestrados — palavra que, não nos esqueçamos, tem que ver com "mestre"), ouvindo um professor que leciona (dá lição) o tempo quase todo, falando ao microfone que fica ao redor de seu pescoço, os alunos só se manifestando quando solicitados. Se levados ao laboratório de informática, os alunos conseguem demonstrar grande proficiência no trato com a tecnologia, mas o conteúdo a que aplicam a tecnologia continua sendo um conteúdo altamente tradicional.

Sem querer exagerar, e deixando de lado a tecnologia, que não tínhamos, as escolas que vi se pareciam muito, enquanto ambientes de aprendizagem, com as escolas públicas que freqüentei de 1950 a 1960, no curso primário e ginasial. Não é preciso relembrar ninguém aqui que as escolas públicas brasileiras desse período eram excelentes — enquanto ambientes de aprendizagem tradicionais, segundo os quais educar era transmitir conteúdos disciplinares ("to deliver content", como dizem os gringos), algo que se fazia pelo ensino, ensino esse ministrado por professores especializados em blocos estanques de conteúdos (disciplinas acadêmicas, dosadas por série) — e aprender era absorver e assimilar esses conteúdos, coisa que se aferia através de provas e exames. Nossos professores eram bem preparados, dentro desse paradigma, ganhavam relativamente bem, tinham elevado status social e a coisa toda funcionava mais do que a contento: havia uma concorrência brutal para entrar na escola pública. No ano de 1956, em que entrei no Ginásio, entraram menos de dez por cento dos candidatos ao Exame de Admissão do então celebrado "Colégio Estadual e Escola Normal ‘Dr. Américo Brasiliense’", de Santo André (na Praça do Quarto Centenário). Menos de dez por cento: mais de dez candidatos por vaga.

A qualidade da escola pública brasileira dos anos 50 nos permite compará-la (a meu ver) com a qualidade das escolas que se saem bem no PISA, hoje.

Mas sua seletividade a constrasta frontalmente com essas escolas. A escola pública brasileira dos anos 50 atendia a um percentual pequeno da população. As escolas finlandesas e asiáticas (dos países indicados) atendem basicamente a toda a população na faixa etária escolar. Aí está o que, a meu ver, deve ser investigado com mais profundidade. E minha conjetura (popperiana) é de que não há maior mistério no sucesso das escolas bem classificadas no PISA: elas fazem o que nós fazíamos nos anos 50: levam a educação a sério, investem significativamente no sistema escolar, pagam bem os professores, fazem do magistério uma carreira econômica e socialmente atraente, etc.

Só que a Finlândia e os países asiáticos indicados fazem isso com basicamente toda a população — nós só o fazíamos com uma parcela selecionada, que de certo modo era, ou estava destinada a ser, a elite intelectual do país.

Deixando de lado por um momento a Coréia do Sul e Taiwan, que são países de maior população, é necessário destacar que a Finlândia e Hong Kong são países de população muito pequena e estável (na verdade, com o que os entendidos chamam de "crescimento negativo"). A Finlândia tem cerca de 5 milhões de habitantes e Hong Kong um pouco mais: por volta de 7 milhões. Cabem duas Finlândias dentro do município de São Paulo (não da Grande São Paulo). A Finlândia e Hong Kong juntos representam mais ou menos um terço da população do Estado de São Paulo. Cabem duas Helsinkis dentro da Campinas.

E a população aqui no Brasil, embora tenha tido taxas de crescimento menores (em relação ao que eram), continua a crescer. Não nos esquecemos de que, em termos de população, o Brasil cresceu, nos últimos 35 anos, nada menos do que VINTE FINLÂNDIAS (passando de cerca de 90 milhões na época da Copa de 70 para cerca de 190 milhões hoje).

E a Finlândia (deixando os outros países temporariamente de lado) é um país rico com uma longa tradição cultural. Nós no Brasil estamos esperando nosso primeiro Prêmio Nobel (até a Argentina e Portugal já têm o deles). Enquanto a isso, a pequenina (em termos de população) Finlândia tem nada menos do que QUATRO:

Ragnar Arthur Granit (October 30, 1900, Helsinki, FinlandMarch 12, 1991, Stockholm, Sweden) was a Finnish scientist who won the Nobel Prize in Physiology or Medicine in 1967, along with Haldan Keffer Hartline and George Wald. He was a 1927 graduate of the University of Helsinki Faculty of Medicine.

Frans Eemil Sillanpää (September 16, 1888June 3, 1964) was one of the most famous Finnish writers. He was awarded the Nobel Prize in Literature in 1939.

Artturi Ilmari Virtanen (IPA: [ˈɑrtːuri ˈilmɑri ˈvirtɑnen]) (January 15, 1895November 11, 1973) was a Finnish chemist and a recipient of the Nobel Prize in Chemistry in 1945.

Heikki Ollila was chosen to receive the 2005 Nobel Peace Prize on behalf of the International Atomic Energy Agency (IAEA) and its chief, the Director General Mohammed El Baradei. Mr. El-Baradei and the agency will share the prize.

(http://en.wikipedia.org/wiki/Category:Finnish_Nobel_laureates)

Tão importante quanto serem quatro os prêmios é fato de que foram em áreas diversas: Fisiologia ou Medicina, Química, Literatura e Paz — o que mostra bom nível cultural nas ciências e nas humanidades. Os prêmios foram concedidos de 1927 a 2005.

Há um outro fator para o qual quero chamar a atenção, que alguns vão julgar irrelevante — mas que eu considero pertinente. Hoje, aqui em Helsinki, estava noite às 16h30 — e amanhã só vai amanhecer depois das 8. Quando chegar o Inverno, em Dezembro, os dias por aqui terão claridade apenas por cerca de três horas — o que significa que as noites têm mais de vinte horas. E, hoje, em pleno Outono, a temperatura chegou a menos sete graus Celsius aqui em Helsinki. Frio para ninguém botar defeito — e para ninguém colocar defeito. Num contexto desses, ficar em casa é a regra. E uma das coisas que se faz em casa quando está escuro lá fora durante 90% do tempo e gelado durante 100% é ler, estudar, conversar, escrever — ou ficar deprimido e encher a cara (os finlandeses, segundo meu "Guia Turístico", estão entre os maiores beberrões do mundo e suas taxas de suicídio são elevadíssimas). Enquanto isso, temos sol e calor o ano todo na maior parte do país, temos não sei quantos quilômetros de praias convidativas, etc. 

Quem duvida que esse tipo de consideração seja pertinente é convidado a ler Vianna Moog, Bandeirantes e Pioneiros.

Para encaminhar essa fase da discussão para uma conclusão: para mim o admirável (dentro do contexto da escola tradicional) é o que a Coréia do Sul e Taiwan estão fazendo — pois têm populações muito maiores do que a Finlândia, Hong Kong e, naturalmente, Cingapura (que tem apenas dois milhões e pouco de habitantes).

MAS a escola tradicional tem seus dias contados. Disso não tenho dúvida alguma. Argumentei em favor dessa tese em vários lugares. Um deles foi um artigo no meu blog "Liberal Space" no dia 28/4 deste ano: vide "Educação no Norte e no Sul" em

http://ec.spaces.live.com/blog/cns!511A711AD3EE09AA!1512.entry 

E os educadores com quem tenho conversado na Finlândia e nos países asiáticos indicados sabem disso — especialmente os asiáticos. Eles sabem que suas escolas preparam excelentes técnicos, maravilhosos cumpridores de ordem, capazes de seguir as instruções mais difíceis (desde que precisas), mas não conseguem preparar gente com elevados graus de capacidade criativa e inovadora, gente que saiba lidar com ambigüidade e complexidade, gente competente na solução de problemas inéditos, para os quais não há precedentes, gente que tem capacidade de liderança, que sabe negociar, que tem competência na resolução de conflitos interpessoais, que sabe trabalhar bem em grupos de iguais em que ninguém dá ordens e transmite instruções, gente que sabe fazer planejamento estratégico de longo prazo, inclusive da própria vida, e que sabe administrar os recursos básicos que viabilizam o gerenciamento competente de projetos: pessoas, tempo, dinheiro, e recursos materiais.

E assim vai.  

É por isso que o pessoal desses países faz curso de engenharia ou matemática em suas universidades e vai fazer Mestrado (especialmente o MBA) ou Doutorado fora — particularmente nos Estados Unidos.

Enfim… É isso o que penso. Alguns amigos me pediram que deflagrasse uma reflexão sobre a Finlândia, já que estive lá por esses dias, em eventos relacionados à educação escolar. É isso o que penso. Foi isso que, em parte, disse aos finlandeses. Não chamei a atenção deles para o fato de que têm altas taxas de consumo de álcool e suicídio — mas um outro palestrante destacou exatamente isso no início de sua fala.

Uma última palavra. Há gente que é muito cético da mídia — mas aceita mais ou menos acriticamente a tese de que os testes do PISA medem realmente qualidade em educação, e que, portanto, as escolas da Finlândia e dos "Tigres Asiáticos" são as melhores do mundo. Minha sugestão é que entrem no site do PISA e verifiquem as mudanças que os organizadores do teste estão contemplando para as próximas edições.

ET: Lendo uma versão anterior deste artigo, meu amigo Rev. Wilson Azevedo, cuja filha já estudou na Escola da Ponte, em Vila Nova do Famalicão, ao lado do Porto, e que dá cursos a distância sobre a visão pedagógica dessa escola, me perguntou:

"Estou aqui pensando: se em Portugal tem uma Escola da Ponte, se no Brasil tem uma Lumiar, o que tem nestes países em termos de reinvenção da escola? Você viu alguma coisa nesta direção?"

Respondi a ele por e-mail basicamente o seguinte:

Pode ser que haja, Wilson. Eu não vi. Da próxima vez, quem sabe, sairei ‘campeando’ uma por aqui… Quem sabe ache.

Mas fico me lembrando de um famoso ditado americano: "If it ain’t broken, don’t fix it". Traduzindo literalmente, "Se não está quebrado, não conserte". O equivalente desse ditado no Brasil é "Em time que está ganhando não se mexe".

Em coerência com esses ditados, Nicholas Negroponto disse, numa palestra no COSN (Council of School Networking), em Washington, em Março de 2004, a que eu tive o prazer de assistir, que o principal obstáculo à inovação nas escolas dos países desenvolvidos é a qualidade que se percebe nelas (ou a qualidade que se lhes atribui). Quanto maior a qualidade percebida de um sistema, menos dispostas estão as pessoas a tentar mudá-lo, porque a mudança pode dar errado e colocar em risco o sucesso alcançado. O inverso também é verdadeiro: Quanto pior a qualidade percebida de um sistema, mais dispostas estão as pessoas a tentar encontrar alternativas radicais: se as mudanças não derem certo, aquilo que elas propunham mudar não deve ficar pior por isso… e, por outro lado, elas podem dar certo…

Com base nessa "lei", Negroponte concluiu que as maiores inovações na área de educação nos próximos anos devem vir dos países em que as escolas são piores… Se isso é verdade, temos grande chances de ganhar ESSA competição (mesmo perdendo a atual de PISA)…

Estou saindo do hotel para ir para o aeroporto. São 4 da manhã da segunda, e, portanto, já do dia 5 de Novembro. 

Em Helsinki, 4 de Novembro de 2007

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O décimo quarto dia da viagem: 4 de Novembro

Sai do Brasil no dia 22/10, uma segunda-feira. Hoje é domingo. Completam-se hoje duas semanas de viagem (para ser preciso, completar-se-ão só amanhã por volta das 14h, mas…)

Meu vôo sai para Helsinki um pouco depois das 14h. Fiz, aqui no Holiday Inn de Oulu, reserva para o Holiday Inn de Helsinki que fica perto do aeroporto. O vôo para Frankfurt sai às 7h da manhã — não vale a pena ir até o centro de Helsinki só para passar frio no centro… Frio por frio, passo no hotel do aeroporto mesmo. Dizem as predições que fará -7 hoje em Helsinki.

Vou agora tomar meu café. Aqui tenho comido ovos mexidos, umas almondegazinhas cozidas, e "hashed brown potatoes", que, para meu gosto, é a forma mais gostosa de comer batatas que existe, embora certamente não a mais sadia. Ganha até da batata frita do McDonald’s.

Depois do café, se achar meus companheiros, vamos dar uma volta, para ver se achamos algum comércio aberto.

Volto mais tarde.

Acabei de descobrir que a Embaixada do Brasil na Finlândia tem um site na Internet, bastante informativo. Nesse site há a informação de que Dom Pedro II realmente esteve na Finlândia no final do século XIX (pelo jeito acompanhado do Czar da Rússia, que era seu parente). Vide http://www.brazil.fi/brazil/index.php?p=News/1&lang=PO&art_id=1133960937_571.

O mesmo artigo afirma que "o primeiro navio que tocou a Finlândia após a Segunda Guerra mundial trazia café brasileiro". Informação interessante — embora de duvidosa utilidade…

Fuçando na Internet descobri que a pequenina Finlândia (que tem um pouco mais de um-vinte avos da população brasileira e que tem uma história como país independente que tem metade da duração da do Brasil) já teve quatro prêmios Nobel, a saber (segundo a Wikipedia):

Ragnar Arthur Granit (October 30, 1900, Helsinki, FinlandMarch 12, 1991, Stockholm, Sweden) was a Finnish scientist who won the Nobel Prize in Physiology or Medicine in 1967, along with Haldan Keffer Hartline and George Wald. He was a 1927 graduate of the University of Helsinki Faculty of Medicine.

Frans Eemil Sillanpää (September 16, 1888June 3, 1964) was one of the most famous Finnish writers. He was awarded the Nobel Prize in Literature in 1939.

Artturi Ilmari Virtanen (IPA: [ˈɑrtːuri ˈilmɑri ˈvirtɑnen]) (January 15, 1895November 11, 1973) was a Finnish chemist and a recipient of the Nobel Prize in Chemistry in 1945.

Heikki Ollila was chosen to receive the 2005 Nobel Peace Prize on behalf of the International Atomic Energy Agency (IAEA) and its chief, the Director General Mohammed El Baradei. Mr. El-Baradei and the agency will share the prize.

(http://en.wikipedia.org/wiki/Category:Finnish_Nobel_laureates)

Tão importante quanto serem quatro os prêmios é fato de que foram em áreas diversas: Fisiologia ou Medicina, Química, Literatura e Paz. Os prêmios foram concedidos de 1927 a 2005.

Estou no lobby do hotel, agora, esperando o pessoal descer para a gente ir para o aeroporto. Hoje, depois do café, saí para tirar umas fotos de downtown Oulu (que coloquei num álbum), e quase fiquei congelado. Tirava uma foto e tinha de fechar a câmera para colocar as mãos nos bolsos por pelo menos um minuto, para elas se esquentarem um pouquinho. O vento parecia que penetrava a pele. Meus lábios estão queimados, apesar de ter usado aquele bastãozinho "Chap Lips".

Volto a falar quando estiver em Helsinki novamente.

Já estou em Helsini — são 16h20. Nevou hoje cedo aqui: o chão estava todo branco quando o avião estava aterrisando. Deixei minha mala grande no aeroporto (estava muito pesada) e trouxe a maleta de mão e a mochila. Agora estou aqui no hotel (Holiday Inn Grand Court, Helsinki Airport). São 16h30 e já está basicamente escuro. Amanhã tenho de me levantar às 4h30, mais ou menos, me aprontar, tomar café e ir para o aeroporto, para pegar o vôo para Frankfurt às 7h10.

Relato mais coisas amanhã. O dia será longo, porque conforme o tempo passa irei virando o relógio para trás… 

Em Oulu e Helsinki, 4 de Novembro de 2007

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O décimo terceiro dia da viagem: 3 de Novembro

Acordei-me às seis horas hoje com as badaladas do sino do relógio da Catedral Luterana, que fica ao lado do hotel. A primeira já me acordou — e fui contando as demais para saber que horas eram. Da minha janela dá para ver o lindo relógio na torre da igreja. A torre se parece com a torre do prédio da administração do seminário onde estudei em Pittsburgh, de 1967 a 1970.

Fui responder meus e-mails e entrei na minha conta no Orkut, para ver como estava a comunidade "Eu fiz parte da EduTec", comunidade essa criada pelo meu amigo Rev. Wilson Azevedo, um dos primeiros ingressantes na EduTec.

A EduTec foi literalmente a primeira grande comunidade virtual existente no Brasil. Formalmente era uma lista de discussão na Internet (no Yahoo! Groups). Na prática e na realidade tornou-se uma real comunidade virtual, que chegou a ter mais de mil membros. O tema básico do grupo era Educação e Tecnologia, mas, na prática, a gente discutia educação em geral — e até mesmo outros tópicos.

Em 2000, quando coordenei o Congresso Educador, da Promofair, que teve cerca de quatro mil participantes aquele ano, tivemos um encontro presencial de um bom número dos membros da EduTec: o núcleo central esteve lá. Saímos jantar um dia, no restaurante do Hotel Ibis, onde muitos estávamos hospedados. Outro dia fomos tomar chopp no Shopping Center Norte. Foi uma experiência deliciosa. Lembro-me de que participaram do encontro o Renato Soffner, o Renato Mineiro, o Delarim, a Lenise, a Raquel, a Edilene, a Lourdinha, a Clara… E muitos outros. A Microsoft me deu um brinde para distribuir (um porta-lápis, no qual estava escrito EDUTECNET e MICROSOFT — ainda tenho alguns deles em casa) e mandei fazer um crachá com o nome de cada um…

A gênese da EduTec foi a seguinte… No final de Outubro de 1998 tive um encontro com Carlos Alberto Ferreira, que era Gerente de Educação da Microsoft Brasil. Ele me recomendou criar o site EduTec.Net (o nome era EDUTECNET) e a lista — e foi o que fiz. Ele logo deixou o cargo na Microsoft e a Márcia Teixeira assumiu a posição que ele tinha — e me concedeu ajuda financeira para dar ao site uma cara mais profissional (que é a cara que o site http://edutec.net ainda tem até hoje: não tenho tido tempo e tesão para atualizá-lo.

No devido tempo registrei os domínios edutec.net, edutecnet.com e edutecnet.com.br. Registrei também no INPI a marca EduTec.Net.

No início, convidei uns poucos amigos para participar e a lista foi crescendo naturalmente daí para frente.

O encerramento da lista foi em Setembro de 2001, quando do 9/11. Alguns membros da lista começaram a utilizá-la para, não demonstrando nenhuma sensibilidade, humana que fosse, com a tragédia, unir-se aos muçulmanos que dançavam nas ruas de alegria porque alguns atos terroristas de grande porte contra os Estados Unidos haviam sido bem sucedidos. Pensei comigo mesmo: "É para isso que estou mantendo essa comunidade virtual?" Concluí que não era e resolvi fechar a lista. Alguns membros ficaram revoltados e argumentaram que eu não tinha esse direito, que uma comunidade, uma vez criada, não pode ser destruída assim, que meu ato de destruição era pior do que o ato que destruiu as Torres Gêmeas, etc. Mantive-me na decisão tomada.

Alguns membros da EduTec formaram uma outra comunidade, que, acredito, existe até hoje, a Cogito (acho que é esse o nome). O criador dessa lista foi o Renato Mineiro, que havia sido um dos que soltaram rojões virtuais na EduTec quando as Torres Gêmeas foram destruídas. Mas, pelo que sei, a Cogito nunca cresceu muito.

O Renato Mineiro fez tese de Mestrado sobre a EduTec. Uma jornalista do Alagoas, de cujo nome não me recordo agora, fez seu trabalho de conclusão de curso de Especialização sobre a EduTec.

Achei interessante e curiosa a criação, agora, pelo Wilson Azevedo, da comunidade "Eu fiz parte da EduTec" no Orkut. Lá já foi lançada a questão se a EduTec deveria ser recriada. Eu, pessoalmente, acho que tentar recriar uma comunidade daquela é mais ou menos como tentar reconstituir um casamento depois de seis anos de divórcio: é uma iniciativa que pode até dar certo, mas que tem pouca chance.

A EduTec foi minha segunda aventura na área de comunidades virtuais.

Eu já havia tido uma lista de discussão sobre Educação e Tecnologia hospedada nos computadores da UNICAMP. Criada em 1987, chamava-se INFED. A lista era no que então se chamava de BitNet, rede iniciada pela IBM que fez as vezes de Internet enquanto esta não se expandia mundialmente.

A discussão na INFED era em Inglês — imaginei, quando a criei, que discutindo em Inglês ela atrairia mais participantes. O número de participantes chegou a passar de 300 — quando tive a idéia de convidar o Valdemar Setzer para participar. Ele literalmente implodiu a lista. Começou transcrever trechos enormes de um livro que estava escrevendo sobre o uso de tecnologia na educação e assustou todo mundo, ou, mais literalmente, encheu o saco de todo mundo. A lista começou a se esvaziar até que um dia a fechei.

Depois da EduTec, criei várias comunidades virtuais na Internet. A maior delas, que continua até hoje, é a 4pilares (vide http://4pilares.net). Mas não tem a mesma vitalidade da EduTec. Inicialmente a 4pilares foi patrocinada pela Microsoft e pelo Instituto Ayrton Senna. Quando o Instituto resolveu que não iria mais se envolver com isso, me autorizou a manter a comunidade em meu próprio nome. Isso resolveu uma série de problemas que a lista enfrentou, como, por exemplo, não discutir política. Foi em decorrência dessa determinação do Instituto que acabei criando uma segunda comunidade, a LivreMente (http://livremente.net) para discutir qualquer coisa, sem restrição alguma. A LivreMente continua até hoje, sendo palco de algumas brigas homéricas, especialmente envolvendo o Antonio Morales (o "Tonhão"), esquerdista de quatro costados e, como eu, ateu convicto, e a Lenise Garcia, da UnB, católica ferrenha, do Opus Dei.

O Tonhão é ex-diretor do SENAC de Bauru. Com sua mulher, Ely, ele foi colega de turma de minha mulher, Sueli, no Curso de Pedagogia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Rio Claro (hoje UNESP). 

Mas nada disse nem que ver com Oulu, Finlândia… Apenas deixei minha mente correr solta.

Agora vou tomar banho, fazer a barba e descer para tomar café. Volto mais tarde.

Voltei logo depois do banho… Os banheiros aqui da Finlândia todos (que eu conheci) têm um rack de toalhas aquecido. Os canos em que as toalhas ficam penduras ficam bem quentes. Assim, quando você pega a toalha de banho para se secar ela está quentinha. Creio que num clima frio como este, essa é uma invenção genial. Especialmente porque o termômetro externo indica uma temperatura externa de -1 no momento… No quarto a temperatura é confortável: 22 graus.

São quase 8 e meia e o dia está começando a clarear agora.

Está chegando a hora do almoço. O sol até que ameaçou sair, mas parece que se arrependeu. Continua frio.

Eu ia até o shopping center hoje à tarde, mas parece que é feriado e o comércio está todo fechado. E amanhã é domingo, e, por isso, parece que o comércio continua fechado… 😦

Esqueci-me de dizer que ontem no jantar havia um historiador, doublê de comediante, que fez um monte de graça sobre a história da Finlândia. Depois ele andou no salão, conversando com os diversos grupos nacionais. Quando chegou à nossa mesa, descobriu imediatamente que estávamos falando Português, e, em seguida nos contou uma história. Dom Pedro II, segundo ele nos informou, veio à Finlândia em 1876. Aqui ficou amigo de todo mundo, como ele normalmente fazia. Chegou a gravar o nome dele, "Pedro II", numa árvore, e a gravação está lá até hoje — mais recentemente com uma placa colocada ali pela Embaixada Brasileira, informando quem era Pedro II, quando o nome dele foi gravado ali na árvore, etc. Não sei se é verdade, mas a história é plausível. Li recentemente uma biografia de Drom pedro II e fiquei sabendo que ele fez, mais ou menos na época mencionada, uma viagem longa à Europa. E o livro informa que Dom Pedro II era muito popular quando visitava outros países, porque se comportava como uma pessoa do povo e não como a realeza que de fato era.

Encerrado o encontro. Não gostei muito das apresentações de hoje — mas não vou comentá-las aqui. Agora vou sair um pouco para andar, refrescar a cabeça, e, depois, jantar.

21h: Voltei do jantar, muito bom, por sinal. Comi um entrecôte delicioso, de entrada comemos carpaccio de salmão e umas ostras fritas individualmente no óleo, com alha, dentro de umas caçapinhas "the likes of which I had never seen before".

Em Oulu, 3 de Novembro de 2007

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O décimo segundo dia da viagem: 2 de Novembro

Chegamos à Estação Ferroviária de Oulu hoje, às 0h20. Felizmente era a parada final do trem, porque tínhamos tantas malas e pacotes que teria sido difícil tirar tudo do trem nos poucos minutos que ele normalmente pára numa estação intermediária. Mesmo sendo a estação final do percurso, as portas do trem se trancaram antes de tirarmos todas as malas — na verdade, antes de todo mundo sair. Precisamos encontrar a chefe da estação para reabrir o trem…

Na estação, tudo deserto. Arrastamos as malas para a frente da estação, onde havia um Ponto de Taxi (escrito Taksi). Havia umas três ou quatro pessoas já esperando. Felizmente os taxis foram chegando rápido e, quando era nossa vez, chegou uma van, que acomodou toda nossa bagagem (embora de forma precária). O hotel (Holiday Inn) não era longe — nada é longe aqui, porque a cidade é pequena. O hotel é bastante bom — Internet com cabo no quarto.

São 7h45 da manhã e acabo de voltar do restaurante, onde tomei um café delicioso. O dia continua escuríssimo, as luzes da rua estão acesas e os carros trafegam com os faróis ligados em luz baixa (nenhum apenas com a lanterna, como é prática nefasta no Brasil).

A reunião de hoje se realizará numa escola aqui perto, chamada Myllytulli School. O endereço é rua Kirkkpkatu 1. Iremos andando.

Como se pode ver de algumas palavras que transcrevi, o finlandês usa e abusa de dobrar letrar — especial o "k". As vogais "a" e "o" freqüentemente recebem trema. Consta que o sobrenome do campeão da Formula 1 é Räikkönen — com dois "ks" e trema no "a" e no "o".

O fim da viagem começa a ficar visível. Saio daqui de Oulu no dia 4 (domingo), depois de amanhã, durmo no domingo em Helsinki e, na segunda, dia 5, pego o avião da Lufthansa para Frankfurt, de lá o avião da United para Washington, que chega no mesmo dia, e, finalmente, um outro avião da United para São Paulo — onde chego no dia 6, terça-feira.

Já estou com saudade da família e de casa — neste caso, principalmente do sítio.

Hoje é dia de Finados.

Estou aqui na Myllytulli School. É o fim do intervalo do almoço. Estamos nos reunindo numa sala de aula, almoçamos na cafeteria da escola… A sala e o refeitório deixam a desejar como local de reunião e alimentação, mas é interessante viver um pouco dentro de uma escola, com os alunos loirinhos passando em frente para ver quem são os visitantes, alguns com aparência meio exótica, que aterrisaram na escola hoje…

Os prédios são antigos — a escola tem mais de cem anos, e alguns dos prédios devem ser tão velhos quanto a escola.

À tarde teremos mais palestras e mais discussões em grupo. As doze escolas começam agora a se apresentar e a apresentar seu projeto pedagógico. A Lumiar está no primeiro grupo de três escolas a se apresentar: será a última desse grupo. Vamos mostrar um vídeo que foi feito, e que está muito bom, e, depois, responder perguntas.

À noite há um programa especial, que inclui, mas os que gostam mais de aventura, uma visita a uma sauna — que é uma instituição nacional aqui na Finlândia. Eu prefiro tomar um vinho em algum lugar…

A cidadezinha é bonitinha, pequena, numa baía. Como que para nos cumprimentar, o sol resolveu aparecer, fazendo desaparecer a escuridão e, até mesmo, o frio. (A escuridão desapareceu de fato; o frio só diminuiu).

Estou com sono, pois acabei indo dormir às 2h30 hoje de madrugada.

Bom, a parte da tarde do evento está para começar. Vou parando, para voltar depois.

São 23h15. Acabo de chegar do jantar que foi realizado num lugar antiqüíssimo, às margens do rio Oulu. A comida foi muito boa, a bebida melhor ainda (vinho branco, vinho tinto, vinho de sobremesa, vodka Finlandia gelada…), e, depois do jantar, foto do grupo, sauna (pra quem quis), passeio de charrete (no escuro), etc. Tudo muito bem organizado.

Agora estou com sono, depois de tanta bebida. Escrevo mais amanhã, dando detalhes sobre o local.

Em Oulu, 2 de Novembro de 2007

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O décimo-primeiro dia da viagem: 1 de Novembro

Escrevo durante uma palestra de uma executiva da Nokia (Riitta Vanska). Além de ela não ter "o dom da palavra", o conteúdo que ela está apresentando é muito chato.

Antes dela falou Anoop Gupta, Vice-Presidente Corporativo da Microsoft para Produtos e Soluções Educacionais. O tema foi "A Vision of Innovation in Education and Beyond". A conversa de ontem foi melhor — embora a fala de hoje tenha sido acompanhada por lindos slides.

Abrindo o dia houve uma fala muito interessante de Stan Slap, Presidente de uma empresa chamada Slapworld — vide http://slapworld.com. O site é meio doido, e ele de vez em quando também parece um pouco exagerado, mas o conteúdo de sua fala foi interessante.

Falando sobre a diferença entre o "manager" e o "leader", ele disse algumas coisas interessantes. Uma coisa que ficou na minha cabeça foi a seguinte. O foco do líder está nos seus valores. São eles que lhe fornecem uma visão e, através dela, o incitam a agir. Ele citou o exemplo de Martin Luther King, com seus valores de liberdade e igualdade. "I have a dream…" O bem que King fez para os negros americanos, disse Slap, não foi feito porque ele era altruísta e queria fazer o bem para os seus semelhantes. O líder, explicou ele, é a pessoa mais egoísta que existe. Ele vive e age em função de seus valores, de sua visão. O problema é que, o mais das vezes, os valores são tão amplos, a visão tão abrangente, que é impossível realizá-los sozinhos: é preciso engajar os outros na própria visão. É por isso que líderes em geral são bons em comunicação e persuasão: eles precisam comunicar sua visão e persuadir os outros a aderir a ela.

Se o líder conseguisse realizar implementar seus valores e realizar sua visão sozinho, disse Slap, ele teria feito isso e teria dito para o resto das pessoas: "I have a dream. And you are not in it…! 🙂

Essa visão de liderança é o oposto da visão de liderança como serviço, que eu discuti no meu blog Liberal Space (http://ec.spaces.live.com) no artigo "Liderança (Ou: O Monge e o Filósofo)", em http://ec.spaces.live.com/blog/cns!511A711AD3EE09AA!1546.entry.

Está chegando a hora do café aqui… De tardezinha vamos para Oulu, de trem. O trem sai por volta das 18h e chega um pouco da meia-noite. Leva seis horas — apesar de, em linha reta, o trajeto ser 350 km, mais ou menos. Devemos jantar no trem. O hotel aqui nos deixou sair às 15h do quarto. Na hora do almoço vou lá arrumar minhas coisas.

Não sei se vai dar tempo de voltar a escrever hoje. Caso contrário, amanhã relato o resto do dia.

Saudações Tricolores a todos.

Estou de volta, às 18h53, no trem que vai de Helsinki a Oulu. Estamos no vagão de primeira classe a Ana Teresa Ralston, a Maria Cláudia "Cacau" Lopes da Silva, a Daniella Dupont, o Gustavo Morcelli e eu. Só nós cinco vamos para Oulu. O restante ficou em Helsinki, devendo alguns voltar para Paris amanhã, ficando lá alguns dias antes de voltar ao Brasil.

Hoje à tarde houve uma apresentação sobre a Lumiar feita pela Cacau. Fez a apresentação muito bem, apesar do nervosismo que vinha sentindo desde que soube que teria de fazer a apresentação. Ao final apresentou um vídeo de 4 minutos mais ou menos em que o Ricardo Semler fala sobre a Lumiar. Foi um sucesso. Várias perguntas — que não houve no caso das apresentações da Irlanda e do Qatar, que precederam a da Lumiar.

O evento final do evento foi uma palestra do Jean-François Rischard, que escreveu o livro High Noon. Quando estive em Tóquio, em Setembro, o Bruce Dixon, que vinha assessorando a Microsoft na montagem do programa, me informou que estava tentando conseguir que o Rischard viesse falar no evento. A descrição que o Bruce fez do livro me fez interessado em comprá-lo. Lá de Tóquio mesmo entre no site do Barnes & Noble e comprei o livro. Quando cheguei ao Brasil, o livro já estava lá. Achei-o muito interessante — embora, como sempre, em casos assim, o diagnóstico é mais interessante do que as soluções propostas.

Jean-François Rischard trabalhou no Banco Mundial durante vários anos e escreveu esse livro, que discute os principais vinte problemas globais do mundo de hoje. Problema global, no caso, é um problema que afeta todo o planeta e que, por definição, não é solucionável dentro dos limites de um ou outro estado nacional, ou mesmo de um bom número deles. Sua solução estaria a exigir estruturas globais e metodologias transnacionais que hoje ainda não possuímos. A ONU e outros mecanismos multilaterais que hoje existem não são suficientes para a solução.

Os vinte problemas podem se classificar em problemas ambientais, que dizem respeito aos aspectos físicos do planeta; problemas humanos, que dizem respeito aos aspectos sociais e culturais; e problemas metodológicos, que dizem respeito aos princípios que permitem a solução de problemas transnacionais.

Entre os problemas ambientais estão o aquecimento global, o desflorestamento, o esgotamento da reserva de peixes, etc. Entre os problemas sócio-culturais os principais são a pobreza, a propriedade industrial, etc. E, por fim, entre os problemas metodológicos está a insuficência, para a solução dos problemas globais apontados, dos mecanismos nacionais e transnacionais atualmente disponíveis para a solução de problemas.

A fala foi interessante — o conteúdo do que foi apresentado, não a forma. O Rischard fala num tom meio desanimado, blasé, como quem não está muito envolvido nas questões que está descrevendo. Quando voltar vou reler o livro.

Uma coisa que ele abordou e que não está no livro foi o papel da educação. No livro ele enfatiza a necessidade de novas metodologias de solução de problemas que nos permitam enfrentam os problemas globais. Na palestra, tendo em vista o fato de que a platéia era de educadores, ele enfatizou o fato de que, além das metodologias, seria necessária uma nova mentalidade (um novo "mind set") que fosse focado na globalidade — e que só a educação poderia ajudar a criar. Nesse novo "mind set" as pessoas se identificariam primeiro com as questões do plano global, depois com as questões do plano nacional e, só por fim, com as questões do plano local. Acho isso meio utópico, porque ninguém nasce prioritariamente "no planeta": nasce num lugar específico, que fica numa cidade ou numa região, que fica numa província ou num estado, que fica num país… O planeta é uma abstração a que se pode chegar depois de um processo complicado de transcendência dos condicionamentos locais e regionais. Não existe, por exemplo, uma língua planetária, global: existe a língua que é falada ali no cantinho em que a gente nasceu, e é ela que se torna a nossa língua materna. Não existe (ainda, embora é possível que se desenvolva) uma cultura planetária, global: existe a cultura que caracteriza o ambiente específico em que se nasce. Dentro dessa cultura está a questão da religião. Não existe uma religião planetária, global, e muito menos um ateísmo ou secularismo global (embora este esteja ganhando espaço nos últimos tempos, apesar dos diversos fundamentalismos). A pessoa em geral adota a religião dos pais ou da família… E assim vai. Imaginar que a educação possa inverter ou reverter esse processo me parece uma utopia — a menos que a educação seja dotada de mecanismos autoritários, quiça totalitários, que tornem possível obliterar, em favor de valores planetários, globais, os valores locais e regionais.

Enfim… As questões, como disse, são interessantes. As soluções propostas, nem tanto.

A Cacau está lendo A Cidade do Sol, do mesmo autor de O Caçador de Pipas. A Daniella está dormindo (deitada nos dois assentos de um banco). A Ana foi ao banheiro. E o Gustavo está, como eu, mexendo no computador dele. Há tomadas aqui no trem. Tenho um adaptador europeu, que carrego sempre comigo, e um universal, que comprei na Austrália no ano passado. Tomamos uma cerveja (de 500 ml) cada um e devoramos um canudinho de batata frita Pringles. Está escuro lá fora. O trem saiu pontualmente às 18h33 e chegará a Oulu às 0h20 de amanhã, dia 2 de Novembro, dia de Finados.

Porque viemos de trem, estamos perdendo um cocktail de recepção que o prefeito de Oulu iria oferecer aos participantes da reunião hoje à noite — às 20h, daqui a uma meia hora (são 19h30). O trem tem uma televisãozinha que apresenta informações, o horário e a velocidade do trem. Estamos a 194 km por hora. Não é o TGV francês, que anda a 300 hm por hora, mas também não é nenhum trem de subúrbio brasileiro. Na verdade, é um trem muitíssimo confortável. Chama-se Pendolino.

A menos que me lembre de algo mais a dizer, só volto a escrever a manhã, já de Oulu.

Estou de volta. O vagão em que estamos tem um cantinho em que há café, leite, bolachas, etc. Uma delícia.

Estou indo de novo.

Por fim, fui até o vagão restaurante, comprei um sanduíche de frango e uma garrafinha de vinho, porque não havíamos jantado.

Agora é final.

Em Helsinki, 1 de Novembro de 2007

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SPFC, Pentacampeão Brasileiro: Dentre os grandes, és o primeiro!

SPFC 2007

Com a vitória de hoje por 3 x 0 sobre o América de Natal, o SPFC se consagra pela quinta vez (e pela segunda vez consecutiva) Campeão Brasileiro, sem precisar dos resultados das últimas quatro rodadas do campeonato. Como diria aquela múmia corintiana que preside o Brasil, nunca antes neste país foi tão fácil ganhar um campeonato nacional. A festa será ainda maior no final de Dezembro se (quando?) o timeco do Parque São Jorge pelo que torce o presidente for rebaixado para a segunda divisão. 

A quatro rodadas do final, o SPFC tem nada menos do que quinze pontos de vantagem sobre o segundo colocado — o só um pouco menos timeco da Vila Belmiro. Quinze! O time chega a 73 pontos no total (tendo a chance de, no final, passar dos 80) e tem um saldo de gols de nada menos do que 38 — mais de 20 gols superior do que o segundo melhor saldo de gols do campeonato. Só em termos de número de vitórias, o SPFC tem no momento quatro a mais do que o segundo colocado.

Consagração total.

Além de ser o primeiro pentacampeão brasileiro que a CBF reconhece, o São Paulo é campeão pela segunda vez seguida. Em 2006 foi campeão com duas rodadas de antecedência. Este ano, com quatro.

O que mais se pode pedir de um time de futebol?

Meus parabéns, aqui da distante Helsinki, para Muricy e seus comandados e, naturalmente, para Rogério Ceni e seus capitaneados, e para todos os que participaram nesta brilhante campanha.

Rogério Ceni é, em termos de conjunto da obra, o melhor goleiro que este país — quiçá o mundo — já teve. É grande defensor e incomparável atacante nessa posição.

Quanto a Muricy, o fato de o Morumbi estar gritando o nome dele, como já fez com o nome do grande Telê Santana, do qual Muricy foi assistente, prova a sua consagração.

Setenta mil pagantes viram o jogo no Morumbi. Como queria ter estado lá!

Eis a notícia da Folha (http://esporte.uol.com.br/futebol/ultimas/2007/10/31/ult59u135431.jhtm):

31/10/2007 – 23h46

Em jogo de festa, São Paulo confirma penta e soberania nacional

Alexandre Sinato e Marcius Azevedo
Em São Paulo
O São Paulo, enfim, pode soltar o grito: é pentacampeão brasileiro. Em uma noite de festa, armada para uma digna final de campeonato, quase 70 mil pessoas pintaram o estádio do Morumbi com as três cores do clube e viram a vitória por 3 a 0 sobre o América-RN, na quente noite desta quarta-feira.

PRINCIPAIS LANCES DO JOGO

Flávio Florido/UOL Esporte

Hernanes comemora o primeiro gol na vitória sobre o América-RN
PRIMEIRO TEMPO

2min – Leandro cruza bola da direita. O goleiro Sérvulo falha na saída de gol, mas Dagoberto, livre de marcação, chuta por cima do gol.

9min – Hernanes faz ótima jogada pelo lado direito, entra na área e chuta para fora, com perigo.

13min – Após cobrança de escanteio de Jorge Wagner, o goleiro Sérvulo falha, mas Breno, livre de marcação, cabeceia para fora.

15min – Aloísio briga com os zagueiros do América-RN e toca para Dagoberto, que, na pequena área, chuta para fora.

28min – Jorge Wagner bate escanteio e Richarlyson cabeceia para o gol. Ney Santos salva em cima da linha.

38min – GOOOLL do SÃO PAULO!!!!!! Hernanes recebe na entrada da área e chuta forte. A bola ainda toca no chão e tira o goleiro Sérvulo da jogada.

44min –O goleiro Rogério Ceni cobra falta e quase marca o segundo do São Paulo. A bola explode na trave.

SEGUNDO TEMPO

1min – Jorge Wagner recebe de Aloísio livre dentro da área, mas chuta em cima do goleiro Sérvulo.

4min – GOOLLL do SÃO PAULO!!!! Jorge Wagner cobra escanteio da direita e Miranda sobe para cabecear, sem chance para o goleiro Sérvulo.

26min – Rogério Ceni cobra falta da entrada da área pelo lado direito e Sérvulo faz ótima defesa, evitando o gol.

31min – GOOOLLL do SÃO PAULO!!! Souza cruza bola da direita e Dagoberto, livre de marcação, cabeceia para fazer o terceiro.

Um empate com o adversário já rebaixado bastava, mas seria pouco para a expectativa e a empolgação dos torcedores que lotaram o estádio. E contagiado por esse clima da arquibancada, o time de Muricy Ramalho não decepcionou. Triunfou, atingiu pontuação (73) que não pode mais ser igualada pelo Santos e ainda quebrou escritas.

A primeira: o São Paulo se tornou o primeiro pentacampeão brasileiro "sem asterisco". Explica-se: o Flamengo se coloca em tal posição, mas a Copa União de 1987 faturada pelos cariocas não é reconhecida pela CBF, que considera o Sport campeão nacional desse ano.

Mais que isso, o clube tricolor nunca havia sido campeão brasileiro com vitória. Em 1977 e 1986, os jogos finais foram decididos nos pênaltis, após igualdades no tempo normal. Nas duas conquistas seguintes, em 1991 e 2006, empates asseguraram mais duas festas tricolores.

Apontado ultimamente como exemplo em organização, o São Paulo, com o penta garantido nesta noite, dá mais um resultado de sua competente estrutura. Afinal, é o primeiro bicampeão desde que o Brasileiro passou a ser disputado por pontos corridos, sistema que privilegia virtudes como regularidade, um elenco e não apenas um time eficiente, e a aposta no trabalho de seu treinador.

Para superar tais escritas e atingir tantas marcas, o São Paulo mostrou a mesma eficiência que o caracterizou durante a competição. Embora o placar do Morumbi marcasse por volta de 27º, a temperatura em campo seguramente foi maior, pelo menos para os anfitriões, abastecidos pela massa tricolor.

Massa que cantou o hino do clube seguidas vezes, que aplaudiu os jogadores mesmo depois de erros e que, é verdade, também se mostrou impaciente com meia hora de jogo, quando o empate sem gols persistia estampado nos placares do Morumbi.

Mas as críticas que, timidamente ameaçavam tomar mais corpo, logo deram lugar ao grito de gol que estava entalado na garganta. Aos 38min, Hernanes, de fora da área, acertou belo chute no canto direito de Sérvulo. Rogério Ceni, ao acertar cobrança de falta no travessão, também levantou os torcedores.

Figurante na festa desta quarta-feira, o América até tentou manchar o cenário tricolor. "Eles ficaram todos atrás da linha da bola, mas nosso time está jogando de forma inteligente, como campeão", avaliou Leandro no intervalo.

A noite, contudo, começou e terminou tricolor. Que o diga Miranda, autor do segundo gol do São Paulo no início do segundo tempo, de cabeça. Dagoberto foi outro que contribuiu, anotando o terceiro, também pelo alto, aos 31min. A torcida ainda comemorou os gols do Flamengo sobre o arqui-rival Corinthians. Enfim, tudo perfeito para o pentacampeão.

SÃO PAULO
Rogério Ceni; Breno (Danilo Silva), André Dias e Miranda; Leandro, Hernanes, Richarlyson, Jorge Wagner e Júnior (Souza); Dagoberto e Aloísio (Borges)
Técnico: Muricy Ramalho

AMÉRICA-RN
Sérvulo; Carlos Eduardo, Rogélio e Robson; Ney Santos, Marquinhos Mossoró, Joellan (Vasconcelos), Tony, Leandro Sena (Washington) e Berg; Geovane
Técnico: Paulo Moroni

Local: estádio do Morumbi, em São Paulo (SP)
Árbitro: Lourival Dias Filho (BA)
Auxiliares: Luiz Carlos Silva Teixeira (BA) e Ângela Paula Ribeiro (MG)
Público: 69.874
Renda: R$ 1.042.850,00
Gols: Hernanes, aos 38min, do primeiro tempo; Miranda, aos 4min, Dagoberto, 31min, do segundo tempo

Em Helsinki, 1 de Novembro de 2007 – 3h50 da manhã; no Brasil, 31 de Outubro, 23h50.

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